Cada trinca que dás está a dar-te vida, ou a tirar-ta!

Relação entre alimentação, Sistema Imunitário e o contexto atual de Covid-19

Quando chegou a hora de eleger o tema para este artigo, a escolha foi óbvia e automática. O Vila Work representa para mim uma referência de dedicação e atitude de serviço público, com uma especial preocupação em dar resposta às necessidades de quem neles deposita a confiança. Não poderia deixar de honrar essa dedicação, propondo-me então a escrever sobre um tema de utilidade maior nesta fase, e que possa agregar valor real e prático ao leitor.
O mediatismo da situação traz consigo a necessidade de esclarecimento. Hoje, talvez mais que nunca, circulam informações massivas sobre alimentos que “curam”, águas quentes que “matam o vírus na garganta”, e uma panóplia de soluções que repassamos nas redes sociais, num esforço de alerta que não questiona a fonte. Vamos descomplicar?
Importa primeiro desmistificar o que já sabemos, mas que fará diferença para a informação que se segue. Não existe ainda cura para a Covid-19. Não existe gengibre, água com limão, água a ferver, ou qualquer outra forma externa de sanar um contagiado. Posto isto, como existem pessoas recuperadas? O que fazem os internados no hospital? Simples. A medicação administrada é de suporte. Vem auxiliar na amenização de sintomas, enquanto o Sistema Imunitário se encarrega de fazer aquilo para que nasceu: defender um organismo de 10 triliões de células. O paracetamol alivia as dores de cabeça, os ventiladores auxiliam na respiração, mas a cura está a cabo de um sistema complexo de estruturas e processos biológicos que o nosso corpo já nasce preparado para executar. Pensemos então no Sistema Imunitário como um General de um exército massivo, treinado para detetar invasores (bactérias, vírus, células cancerígenas, e outros corpos estranhos), distingui-los do tecido saudável do organismo, isto é, separar o que pertence e não pertence ao nosso corpo, e dar resposta imedianta, enviando as tropas certas para eliminação desses invasores. Este sistema funciona silenciosamente 24 horas por dia e, por norma não nos damos conta.
Mas o que faz funcionar o exército?
Todos os soldados precisam de comer, certo? O nosso General usa os nutrientes como arma. A única forma de produzir as defesas necessárias é através da nutrição. Por isso importa tanto aquilo que comemos em excesso como aquilo que deixamos de comer. Vejamos.
As dietas modernas, sobretudo no mundo ocidental, são por defeito desequilibradas. Vivemos de excesso de Gorduras, Açucar e Sal (chamemos-lhe GAS), alienados do facto de que estes invasores geram inflamações constantes que ocupam e retiram eficiência ao nosso Sistema Imunitário. Por outro lado, consumimos com escassez alguns nutrientes importantes, como a proteína, o Zinco, o Selénio, as Vitaminas A,C,E e D, por exemplo. Estamos a sobrecarregar um exército que está em crise de armamento. Somos o Governo que não dá material de combate ao General, e o General não o tem para distribuir pelas tropas, que por seu lado estão sobrecarregadas a usar as poucas armas que ainda possuem contra o “GAS”. O que acontece então?
Chega um invasor maior, o vírus SARS-CoV-2. Dá-se uma pandemia, e embora a nutrição não possa evitar o contágio, é um factor-chave na eficácia de combate do nosso organismo.
Este é um artigo de opinião, mas as opiniões têm de assentar em factos. Os factos são estes: no Reino Unido, o NHS (Serviço Nacional de Sáude) revelou recentemente num estudo que mais de 76% dos internados com Covid-19 em estado crítico estão acima do peso. A Organização Mundial de Saúde diz que 70% das idas ao médico (em geral) são causadas por excessos ou défices alimentares. O Departamento de Comida e Agricultura da ONU revelou há alguns anos um estudo chocante acerca da perda dos nutrientes de frutas e legumes desde 1985. A venda de Fast Food, refrigerantes, bolachas e outros alimentos ricos em açúcar escala desmesuradamente. Temos uma realidade clara: uma população desnutrida com excesso de peso. As pessoas não têm tempo para pensar nos desequilíbrios. E quem até hoje não encontrou tempo para pensar na saúde, está a ver-se obrigado a pensar na doença.
Nada podemos fazer acerca das medidas governamentais, ou até do comportamento das massas. Mas podemos fazer a nossa parte para com os outros cumprindo as indicações das autoridades, e para connosco mesmos, começando a selecionar cuidadosamente o que colocamos no nosso corpo hoje! Não foram só os Governos, infelizmente, que partiram para a Guerra despreparados. Fomos também nós, na maioria, que fomos desprovendo progressivamente o nosso exército imunológico de armas e de eficiência. Acredito que na época pós-pandemia, entraremos numa fase de maior consciência no que diz respeito ao estilo de vida que levamos. É importante valorizar a alimentação pela sua relação com saúde/doença, e não apenas pela forma física. Fazer jús à frase “Cada trinca que dás, está a dar-te vida ou a tirar-ta”. Agregar a isto um estilo de vida ativo, um bom descanso, tratar o nosso General como ele merece. Todos os dias são dias de escolher, e por isso deixo uma questão: que trinca queres dar hoje?

Nadine Fernandes

28-03-2020